15 julho 2016

Assistência Internacional - O Euro ou o Escudo - a CPLP...

Ao aceitar cegamente tudo o que era originado em Bruxelas, promoveu-se a desestruturação da produção e dos hábitos de trabalho.

Várias pessoas me têm dirigido questões sobre diversos temas importantes. Em primeiro lugar quero agradecer as perguntas. Passarei hoje a responder a três delas por me parecerem de interesse para a actualidade nacional e pelo quadro internacional vigente. Duas delas são sobre temas económico-financeiros e uma terceira sobre Política Externa e Estratégia de Estado.

Passemos às perguntas que me foram endereçadas e às minhas necessariamente breves e resumidas respostas:

  • 1. Porque é que em 40 anos de Democracia, já estivemos sob Assistência Internacional por três vezes?
  • 2. Faz sentido continuarmos no Euro, ou seria mais razoável um regresso ao Escudo ou a criação de uma nova moeda?
  • 3. A Lusofonia é sem dúvida um grande Legado que Portugal deixa à Humanidade. O que é preciso ser feito? 

Porque é que em 40 anos de Democracia, já estivemos sob assistência internacional por três vezes?

Quanto à primeira questão do porquê de em 40 anos de Democracia termos tido por três vezes a assistência internacional, tal facto deve-se, na minha opinião, a vários factores de carácter interno e de carácter externo.

No que se refere aos factores externos temos a instabilidade dos mercados petrolíferos (combustíveis e energia) que pesam bastante na nossa Balança de Pagamentos e na nossa Balança de Transacções, factor que é praticamente comum às três crises.

Por outro lado, a Desregulação do Sistema Financeiro que se deu na década de 1980, proporcionou uma situação em que foi mais rentável para a Banca explorar as oportunidades dos mercados financeiros (Bolsas) do que ajudar a fomentar o crescimento económico e o emprego daí derivado,

Em terceiro lugar, e ainda no que toca aos factores externos, direi que a União Europeia quis ser o “paladino” da globalização dos mercados e foi no seio da OMC (negociações do GATT) longe de mais na liberalização das trocas.

Por força dos interesses de países vendedores de equipamentos (Reino Unido e Alemanha sobretudo) abriu as suas fronteiras pautais a produtos manufacturados em países cujos salários, e outros custos de produção, são manifestamente desiguais face ao modelo de sociedade ocidental.

Acresce que este factor provocou uma crescente deslocalização da indústria europeia para esses países, atraída pelo menor custo de produção e pela liberdade de exportar os seus bens para a Europa, com preços muito mais baixos do que quando os produziam no continente europeu.

Ou seja, com esta filosofia errada de liberalizar – sem cuidar de perceber quais seriam as consequências para o emprego europeu, para a criação de riqueza europeia; sem cuidar de saber quais as condições humanas vigentes nesses países extra-europeus (salários, condições de trabalho, horários e bem-estar) para os produtores dos produtos – destruiu-se progressivamente a indústria europeia e destruiu-se boa parte dos empregos estruturais e, consequentemente, o bem-estar que estes proporcionavam aos europeus.

Ao nível interno português, destaco em primeiro lugar a parafernália de promessas de um “el dourado” que o novo regime, saído do 25 de Abril de 1974, prometeu que iria proporcionar aos portugueses, sem cuidar de perceber qual seria a sustentabilidade das mesmas; passou a haver um foco nos Direitos e esqueceram-se os Deveres.

Em segundo lugar, com o PREC destruiu-se o pouco que havia dos grupos industriais fortes, portugueses, permitindo-se a sua nacionalização, o que acarretou perdas de produtividade, organização, planeamento, direcção prudente, o que nos fez retroceder 20 a 30 anos nos índices económicos e desprotegeu o país face ao exterior.

Em terceiro lugar, tudo isto provocou uma fuga enorme de capitais do país, por falta de confiança dos investidores.

E a prazo provocou, com a tal desregulação de fronteiras pautais, a progressiva deslocalização de empresas multinacionais, que até aí tinham investido em Portugal, para outros países – quer ao nível de construção e instalação de unidades industriais, quer ao nível do emprego proporcionado.

Em quarto lugar, com a miragem da, então CEE, para onde iam apenas 25 por cento das nossas exportações em 1973, (o que era razoável em termos de risco), os nossos empresários passaram a eleger a CEE como nosso principal destino, passando as nossas exportações a significar (para esses países) cerca de 78 por cento das nossas exportações, o que se veio a revelar fatal. Isto porque nos mercados europeus o factor em que se jogou foi o preço dos bens e serviços e não o seu valor acrescentado.

Em quinto lugar, (a ordem dos factores é arbitrária) entregou-se o Ultramar português à esfera soviética, numa altura em que o Mundo estava bipolarizado, e com isso enfraqueceu-se Portugal, e o seu tecido económico (pela perda súbita de mercados de exportação e de abastecimento de matérias-primas não sujeitas a cotações internacionais), para além de se terem destruído as vidas de mais de 800 mil pessoas que levaram os 10/20 anos seguintes a tentar refazê-las.

Por último, tal como aconteceu com o Ouro do Brasil, deixámos entrar dinheiro no País oriundo da CEE/UE de qualquer forma, com controlos de aplicação reduzidos ou errados.

Houve um deslumbramento da classe política que a troco de promessas fáceis, deu ao país rotundas, auto-estradas, fontanários, pavilhões gimnodesportivos em aldeias, etc., em vez de se canalizar esse dinheiro para a reestruturação da indústria, das pescas (vendidas a Espanha) e da agricultura (vendida a França). Em futuro artigo explicarei melhor este assunto.

Pelo contrário, ao aceitar cegamente tudo o que era originado em Bruxelas, (até se chegou a pagar aos agricultores para não produzirem, aos armadores de pesca para venderem as suas embarcações, deixando a indústria desprotegida e por reestruturar) promoveu-se a desestruturação da produção e dos hábitos de trabalho.

Com estas atitudes destruíram-se empregos estruturais na nossa economia, que dificilmente voltarão a ser proporcionados.

E chegou-se a esta situação de desnorte e de empobrecimento.

Faz sentido continuarmos no Euro, ou seria mais razoável um regresso ao Escudo ou a criação de uma nova moeda?


Clarificando desde já esta questão é preciso dizer que uma União Monetária faz-se pela fixação de taxas de câmbio fixas e irrevogáveis, não sendo necessária a adopção de uma Moeda Única, ao contrário do que uma minoria activa e forte em meios de comunicação nos quis fazer crer.

Ao se entrar numa União Monetária, aprofundada pela existência de uma Única Moeda, está-se a retirar aos Estados a sua capacidade de gerir a sua própria política monetária, cambial e orçamental que são instrumentos fundamentais para a gestão da economia e finanças públicas.

Este facto que afecta decisivamente a governação por parte do Estado Nacional – da Nação que este representa – facto que pela sua importância deveria ter sido exposto aos portugueses e aprovado ou rejeitado, pelos mesmos, em referendo.

Ao contrário foi negociado nas costas da Nação e Imposto como a solução salvadora. Um único sector foi, e é, claramente favorecido por uma união deste tipo: o sector bancário, por razões que todos conhecem.

Na altura tentei alertar as pessoas para estes perigos. Não fui, nem eu nem os muitos portugueses que tinham e mantêm esta posição, ouvido. Aí têm os resultados sem mais comentários. Mas esta não deve ser uma questão fechada.

É bom esclarecer que se um País sair do Euro, pode permanecer na União Europeia a exemplo dos países que não adoptaram a Moeda Única e que permanecem na organização.

Temos uma Economia fraca, em comparação com a maioria dos nossos parceiros do Euro.

Ora, um país com uma Economia Fraca ter uma Moeda Forte pareceu-me, e continua a parecer-me, um contra-senso, um erro, agravado pelo facto de não termos uma política monetária, cambial e orçamental autónoma.

Os países da UE que estão fora do Euro continuam a permanecer no sistema de “serpente monetária” com flutuações controladas das suas moedas e que me conste não pretendem integrar o euro, na sua maioria.

Por de cima deste facto, não me consta que tenham sido muito afectados pela presente crise internacional. (consultar por favor o Eurostat).

Penso que este assunto devia ser levado à consideração da Nação, em Referendo organizado e Livre, (já devia ter sido organizado antes da entrada) em que as várias visões sobre o assunto sejam expostas de forma estruturada e séria, pois não existe um única solução e alternativa, ao contrário do que os Economistas e Comentadores do Regime, avençados pelo sistema financeiro, têm feito crer.

Existem pelo menos duas posições a discutir:

  • A manutenção no euro;
  • A saída do euro, restauração do Escudo e regresso à “serpente monetária”;

Porque é que não foi feita esta discussão em Portugal, de forma séria?

Talvez o caso BES e outros semelhantes dêem alguma pista ao leitor e ajudem a explicar a razão de não se discutir abertamente este tema. Há muitos interesses, nem todos legítimos, por detrás desta situação.

Nos meios de comunicação apenas o Prof. Doutor João Ferreira do Amaral tem tido voz. Mas existem muito mais pessoas, capazes e sérias, que poderiam dissertar sobre este tema e explicá-lo em detalhe. Mas não convém a esses interesses que essa discussão se faça.

Uma coisa é certa: os custos de entrada de Portugal no Euro foram falsificados, de forma grosseira.

Dou apenas alguns Pequenos exemplos: a vulgar “bica” passou em 24 horas de 50 escudos para 50 cêntimos, ou seja 100 escudos; as rendas médias de casas passaram em apenas dois anos, de 5.000$00/10.000$00 para 500/1.000 euros, ou seja 100.000$00/ a 200.000$00, etc.. etc…

O insuspeito “THE TIMES”, há uns meses, publicou um estudo em que relatava que a entrada no euro tinha acarretado para os países do Sul, Portugal incluído, uma perda de cerca de 300 por cento no poder de aquisição das famílias. Quando se fala que a saída poderá provocar no curto prazo uma perda de 30% …..

Posto isto, o Euro não é um desígnio nacional, muito menos uma obrigação jurídica eterna. É um instrumento financeiro que deve ser utilizado, enquanto for conveniente a Portugal.

Os Tratados são actos Voluntários de Vontade das Nações, celebrados através dos seus representantes que ocupam as posições competentes nos Estados que as representam, e em seu nome.

Podem ser igualmente revogados por qualquer das partes quando se verifique deixarem de ter interesse por qualquer dos signatários, tal como está demonstrado através da História e do consignado no Direito Internacional Público.

No caso do Euro, para Portugal, veremos a prazo, qual a sua evolução e qual a taxa de empobrecimento que ele trará aos cidadãos.

Uma coisa é certa, e os Números não mentem: - Portugal desde a sua entrada no Euro viu a sua Economia e todos os seus indicadores Macroeconómicos definhar, lentamente mas tendencialmente a percorrer o caminho do empobrecimento do País.

Estranho que pessoas com responsabilidades académicas (já que os políticos não o querem fazer) não façam essas análises. Mais a mais porque os números são Públicos: por exemplo os do INE e do EUROSTAT.

Uma coisa é certa e indesmentível: - sem o Euro, teríamos atravessado esta crise financeira internacional com mais à vontade e sem tantos sacrifícios. Ou, talvez mesmo, não a teríamos atravessado de todo.

Prudência é portanto a palavra-chave para esta questão. Discussão pública e democrática, é o mínimo exigível.

Mas inexorávelmente a saída de Portugal do Euro tem que ser equacionada e preparada, a menos que a classe política e os economistas comprometidos nos queiram atirar para a miséria.

A Lusofonia é sem dúvida um dos grandes Legados que Portugal deixa à Humanidade. O quê que é preciso ser feito?

Já o escrevi por diversas vezes de há 20 anos para cá, pelo menos. Situemos então o problema na questão do Sistema Internacional e de qual o papel que a CPLP poderia e deveria desempenhar.

Na verdade o Mundo Global que vivemos implica que saibamos (nós os membros da Lusofonia e da CPLP) que o confronto entre potências mundiais continua (Federação Russa e EUA), ou directamente ou através dos seus aliados preferenciais (Países ou Blocos), para além das ameaças prefiguradas pelos extremismos Islâmicos, “Primaveras Árabes”, e pela situação do conflito Israelo-Palestiniano, sem fim à vista.

Vide os casos da Ucrânia e da Venezuela, que ainda estão longe do ‘términus’ das suas presentes crises internas e ainda longe de uma definição duradoura de Poder, que os leve a uma Paz duradoura.

Ora na verdade é necessário que os novos proto-pólos mundiais como o Brasil, a Índia, a China e a África do Sul se assumam conscientemente como tal, para tentarem influir na construção de um Novo Equilíbrio Mundial.

Na verdade têm progressivamente adquirido a consciência de que têm que exercer, de forma afirmativa, o seu novo papel no Sistema Internacional, de forma a tentar o tal Novo Equilíbrio.

No caso do Brasil, o Presidente Henrique Cardoso foi o primeiro a interiorizar que o Brasil não tem que se confinar a um “aparente destino” de ser apenas uma Potência Regional, tal como até aí acontecia no comando dos destinos da Nação Irmã.

Ora o Brasil e Portugal, bem como Angola, Moçambique e todos os outros países de língua oficial portuguesa, têm à sua disposição um novo instrumento que poderá ser de afirmação internacional.

Só que não o têm visto e tratado como tal: refiro-me naturalmente à CPLP.

Mas para isso será necessário que todos os integrantes deste bloco percebam e interiorizem que este instrumento é fundamental para Todos e que avancem para o seu aprofundamento.

Isto é, a sua extensão para as áreas de Defesa Comum, da Segurança, da Economia e Finanças e de concertação estratégica a nível de uma Política Externa baseada em Mínimos Denominadores Comuns que permitam a sua afirmação como actor internacional.

Para isso é necessário, em primeiro lugar, que os Governos dos Países deste espaço o interiorizem, isto é que os Poderes Políticos desses países, percebam que uma Comunidade assim construída pode potenciar a importância relativa do Bloco e em consequência dos seus integrantes, com evidentes benefícios potenciais para todos.

Isto, sem prejuízo de se inserirem, ou continuarem inseridos, noutros Blocos (ASEAN, UE, NAFTA, etc.) que mais convenha aos seus interesses.

Mas tendo a Noção Clara que:

1. Se o fizerem (o aprofundamento da CPLP no Modelo que defendo) serão parte de um espaço Geopolítico e Geostratégico com relevância mundial.

2. Se o souberem fazer, serão a um tempo: Embaixadores das suas Alianças Regionais junto da CPLP e Embaixadores da CPLP junto desses espaços, com os benefícios e sinergias daí resultantes.

Seguindo a mesma linha, e clarificando um pouco o que atrás escrevi, gostaria de deixar á vossa Reflexão mais os seguintes pontos:

  • 1. A independência das Nações consegue-se, como o venho dizendo há alguns anos, por vários factores dentre os quais destaco: - a Diversificação de Dependências Externas;
  • 2. Nessa linha de raciocínio o simples facto de se aprofundar esta aliança, ainda embrionária, proporcionaria a todos os Estados Integrantes uma alternativa de dependência externa face a outros blocos;
  • 3. Trata-se de uma Comunidade com cerca de 250 milhões de pessoas, espalhadas por cinco Continentes (Europa, África Ocidental e Oriental, América do Sul, Ásia e Oceânia) e três Oceanos (Atlântico, Pacífico e Indico); ou seja um Espaço Mundial;
  • 4. Tem como factor comum a Língua e uma História de mais de 400 anos, com as memórias comuns daí advenientes nos povos que habitam esses Estados;
  • 5. São, todos eles, Estados com “territórios” de Mar apreciáveis, alguns deles com recursos apreciáveis; tal facto podia proporcionar várias sinergias e uma cooperação em termos do aproveitando das Auto-Estradas Marítimas que este factor proporciona;
  • 6. Poderia começar-se pela introdução prática de 4 liberdades: Liberdade de circulação de pessoas, de bens, de capitais e Liberdade de Estabelecimento e pela constituição de um Mercado Comum para os produtos agrícolas e industriais;
  • 7. Deveria, no seu seio, ser concertada uma acção de Política Externa Comum (salvaguardados as pertenças de que acima falei) que levasse este bloco a tomar posições comuns face aos acontecimentos mais graves, nos fora internacionais, o que contribuiria para um Novo Equilíbrio Internacional.
  • 8. Quando os nossos Embaixadores (dos vários países) falam actualmente em algumas Organizações Internacionais, representam Um País. Se representassem oito países, com a implantação referida acima, a sua importância e o peso das suas palavras seria, de facto, no jogo do Poder Mundial, diferente porque mais poderosa.

Mais se poderia dizer sobre estes três temas, mas o que reputo de essencial ficou dito e deixo à vossa reflexão.

MIGUEL MATTOS CHAVES - Doutorado em Estudos Europeus (dominante: Economia) pela Universidade Católica Portuguesa.


1 comentário:

Miranda disse...

Prezado Dr. Matos Chaves,
Fico na esperança de que o governo português, analise os pontos que expôs em seu artigo e que levantam assuntos de alta importância para a economia portuguesa. Aceite os parabéns por estar sempre vigilante em relação aos problemas dos paises lusófonos.

Atc. / José Miranda Reis de Melo
Recife / Brasil