As
transformações na economia europeia e o desenvolvimentismo português
(excertos do Livro “Portugal face à Construção Europeia –
Mitos e Realidades” de Maio de 2005 de minha autoria, editado pela “Sete
Caminhos”)
§1º
A
Economia Europeia
1.
A Economia Europeia nas décadas de 1950, 1960 e
início da de 1970
A Europa,
saída da guerra era uma zona do mundo, e não mais aquilo que tinha sido - o
centro do mundo – a zona dominante. Esse papel passou a ser desempenhado por
duas superpotências, uma euro-asiática e a outra americana.
Todavia a
Europa lentamente começou a recuperar da situação de destruição por que tinha
passado, quer pelo crescimento individual dos Estados, quer pelas formas de
cooperação que conseguiu construir no seu seio, entre esses mesmos Estados, as
quais desembocaram na actual situação de se estar a finalizar algo de inédito,
em tempo de paz: a correspondência, quase total, entre continente e bloco de
cooperação económica e política.
Na verdade,
a formação de sistemas de cooperação entre Estados, no pós-guerra, auxiliou
bastante a recuperação económica da Europa.
Três
grandes Estados, a França, a Itália e a República Federal Alemã atravessaram a guerra,
sentiram-na no seu território, foram devastadas por ela, quer em termos
humanos, quer em termos económicos e recuperaram de tal forma que no final dos
anos sessenta tinham recuperado grande parte do seu poder económico, prestígio
e padrões de vida.
Claro que
demorou tempo. Logo no final da guerra sentiram-se dificuldades com a falta de
dólares necessários para comprar aos EUA os materiais que eram necessários à
reconstrução das cidades, das infra-estruturas em geral, e as matérias-primas
necessárias para pôr em funcionamento o tecido produtivo.
Do outro
lado do Atlântico viria a ajuda no valor de 13 mil milhões de dólares, para os
países da OECE, para o período que mediou entre 1948 e 1952 ([1]). Esta ajuda foi
fundamental para a rapidez da recuperação.
A RFA
recebeu entre 1948 e 1954 cerca de 1.472,6 milhões de dólares do plano, a
França 3.103,8 milhões, a Itália 1.577,8 milhões o Reino Unido 3.585,6 milhões,
isto para falar somente dos países que receberam a maior fatia da ajuda. Os 4
receberam cerca de 66% da ajuda total. ([2])
A produção
industrial dos países da OECE, calculada em relação ao valor de 1938 (base 100)
foi de 87% em 1947, de 98% em 1948, de 110% em 1949, de 122% em 1950 e de 134%
em 1951.
É a partir
desse ano que se começa a falar, por exemplo, do «milagre alemão».
A RFA sob a
orientação do chanceler democrata-cristão Konrad Adenauer e do seu Ministro da
Economia Ludwig Erhard conheceu uma recuperação notável, de tal forma que em
1956 entrava na era da prosperidade ([3]), graças a um forte e prolongado aumento
da taxa de crescimento, que só seria interrompido por uma crise, nos anos de
1966 e 1967. Baseada numa moeda forte e num crescente fluxo de exportações, a
RFA tornou-se uma das principais potências económicas.
Na Itália a
economia teve um crescimento rápido, sobretudo nas regiões do Norte e do
Centro. Os sectores que mais contribuíram para esse crescimento foram os
sectores automóvel e de electrodomésticos.
A França
teve crescimentos fortes e contínuos até ao choque petrolífero de 1973.
Daí que os
franceses quando se referem a este período da sua história, lhe chamam «les
Trente Glorieuses», tornando a França numa das principais potências
industriais.
…………..
Assim e em
termos das taxas anuais médias de crescimento do PNB:
a Alemanha
entre 1950 e 1970 cresceu 5,5%, a França 4,8%, e a Itália 5,4%, sendo comum a
estes países o facto de ser no quinquénio 1965/1970 que tiveram maiores taxas
médias de crescimento anual, respectivamente 6,3%, 5,4% e 6,3%.([4])
……………….
No que se
refere ao PIB per capita, a preços de 1990, comparando os anos de 1950 e
1973 a RFA passou de 4.281 para 13.152 USD, a França de 5.221 para 12.940 USD,
a Itália de 3.425 para 10.409 USD e o Reino Unido de 6.847 para 11.992 USD. Ou
seja a RFA e a Itália triplicaram o seu produto por habitante, e a França mais
que duplicou os seus resultados.
……………
Ao mesmo
tempo, na Europa, a média passou de 3.568 USD em 1950 para 8.814 USD em 1973,
mais que duplicou. Portugal, como se verá, passou de um PIB per
capita de 2.218 para 7.568 USD, ou seja mais que triplicou neste período o
seu produto interno bruto por habitante.
Comparando
com o resto do Mundo a Europa teve um desempenho acima da média, pois enquanto
o PIB per capita Mundial subia de 2.138 para 4.123 a Europa andava por
valores próximos do dobro.
Quadro IV – 1 - PIB per capita –
Preços de 1990 – Valores em USD
País
Zona
Ano
|
1950
|
1973
|
Var %
|
MUNDO
|
2.139
|
4.123
|
92%
|
EUROPA
|
3.568
|
8.414
|
136%
|
EUA
|
9.573
|
16.607
|
73%
|
RFA
|
4.281
|
13.152
|
207%
|
FRANÇA
|
5.221
|
12.940
|
148%
|
ITÁLIA
|
3.425
|
10.409
|
204%
|
REINO UNIDO
|
6.847
|
11.992
|
75%
|
ESPANHA
|
2.630
|
8.739
|
232%
|
Foi este o
panorama geral do crescimento económico europeu, medido a partir de um índice
que permite algumas comparações.
*
2.
O Choque petrolífero de 1973/1974 e as mutações
económicas
Na
sequência da guerra do Yom Kippur, travada entre Israel, por um lado e o Egipto
e a Síria por outro, iniciada no dia 6 de Outubro de 1973, o petróleo tornou-se
uma “arma” no contexto das relações internacionais ([5]). Os EUA ao irem em
apoio do seu aliado do médio oriente, provocaram uma reacção por parte da OPEC([6]) que ia no sentido de
um embargo generalizado, por parte dos países árabes membros da referida
organização, ao fornecimento de petróleo aos países ocidentais. Crise de que
também a URSS aliada dos países árabes se aproveitou, como importante produtor
de petróleo que era.
Esta crise
grave, que afectou práticamente todas as economias ocidentais, foi provocada
pelos países produtores de petróleo, sobretudo os do Médio Oriente, que
impuseram uma descida dos níveis de produção. Este facto acarretou uma subida
dos preços do barril de petróleo dos cerca de 1 dólar para quase 4 dólares ([7]), (quadruplicando o seu
valor). Esta atitude provocou uma recessão generalizada das economias
ocidentais, por duas razões principais:
A primeira pelo facto de as economias ocidentais estarem baseadas, em termos do
abastecimento de energia, no petróleo e seus derivados. Na verdade as fábricas,
os transportes, máquinas agrícolas, a iluminação pública e privada, o
aquecimento, etc... funcionavam a partir dos diversos subprodutos do petróleo,
como por exemplo, as gasolinas de todo o tipo, gasóleos de todo o tipo,
querosene, fuel, óleos lubrificantes, óleos pesados etc., pelo que a subida do
seu custo implicou uma subida nos seus respectivos custos de produção, ou de
laboração, e consequentemente provocou uma subida dos preços de venda dos
serviços prestados por essas empresas e uma subida generalizada dos preços de
venda dos produtos por elas fabricados, ou produzidos.
O resultado
de tudo isto foi que os preços nos consumidores, privados ou públicos,
individuais ou empresariais subiram muito, em pouco tempo.
Esta subida
generalizada dos preços provocou uma quebra no poder de compra por parte do
consumo, o que por sua vez provocou uma necessidade de abrandamento da
produção, por abrandamento da procura, induzindo uma grave crise económica.
As crises,
sobretudo a primeira por completamente inesperada, podem ser caracterizadas, de
um modo simples e curto, por uma trilogia de factores, que coincidiram no tempo
e no espaço: (1) Os preços do petróleo subiram, (2) A Economia deixou de
crescer, por abrandamento quer do investimento quer do consumo, (3) os preços
dos bens e serviços subiram. Assim juntou-se a inflação, à paragem do
crescimento da economia e como consequência o desemprego subiu.
A
desconfiança de investidores e consumidores instalou-se, com prejuízo para o
bom andamento e desenvolvimento da economia dos países ocidentais.
Ao
contrário, os países produtores de petróleo tiveram crescimentos exponenciais
nos seus rendimentos. Nalguns o efeito generalizado foi benéfico para a
melhoria das condições de vida dos seus habitantes, noutros foi apenas a sua
classe dirigente que beneficiou com esta situação.
Os reflexos
destas crises começaram a deixar de se fazer sentir a partir de 1983, mas o
desemprego, sobretudo na França e no Reino Unido, perdurou por mais alguns
anos, a taxas elevadas. ([8]) No entanto estas crises tiveram alguns efeitos
positivos. Esta situação, provocada pela primeira crise de 1973, juntamente com
o segundo choque petrolífero de 1979, em que o barril de petróleo passou para
os cerca de 16 dólares ([9]), (triplicando de valor) chegando o “arabian
light” a 34 dólares o barril em 1981 ([10]), provocou a
necessidade de se encontrarem fontes de energia alternativas ao petróleo. Esta
necessidade contribuiu, e continua a contribuir, para um maior progresso
tecnológico da humanidade. Quer pelas tentativas de diminuir a dependência do
consumo do petróleo e seus derivados, quer porque em termos de ambiente se
assistiu, e se continua a assistir, a algumas melhorias, em algumas zonas, por
diminuição de emissões resultantes da queima destes produtos. Surgiram algumas
indústrias de energias renováveis, como a eólica, outras levaram um novo
impulso, a hidroeléctrica. As maquinarias industriais, mercê da investigação
tecnológica, começaram a produzir mais, gastando menos energia.
Por outro
lado os agentes económicos começaram a ser mais criteriosos e cuidadosos no uso
da energia, a aproveitá-la melhor e mais eficazmente, quer pela introdução de
sistemas de controlo específicos, quer pela introdução de novas tecnologias.
…………….
De qualquer forma esta
crise internacional, pode dizer-se que acabou com os cerca de trinta anos da
“segunda Belle Époque” que se tinham caracterizado por um acentuado crescimento
do nível de bem-estar das populações, - pelo menos das europeias e americanas,
- da economia internacional, em geral e da portuguesa, em particular.
Por via destas crises, o
desenvolvimento do processo da criação da UEM conheceu uma paragem forçada e, o
mesmo, só viria a ser retomado no final da década de 1980 e início da década de
1990, do século XX, como veremos.
… (CONTINUA) ....
Miguel Mattos Chaves
Gestor de empresas
Doutorado em Estudos Europeus (dominante: Economia)
Auditor de Defesa Nacional
E-Mail: matos.chaves@gmail.com
Web link: http://pt.linkedin.com/in/miguelmattoschaves
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