A mentira sobre as Pensões de Reforma
A mentira, de
vários comentadores e dirigentes políticos, sobre o peso das pensões, sobre a
despesa do Estado, e sobre o Produto interno Bruto, tem sido uma constante no
espaço público de discussão.
Para além do mais,
este é um discurso cobarde, Cobarde dado que o alvo é uma das mais frágeis
classes de portugueses.
Frágil porque
não tem sindicatos a protegê-la, não paga quotas aos mesmos, não faz greve, tem
idade que já não lhe permite ser agressiva para com os poderes políticos. A
única “arma” que lhe resta é o Voto.
Mas os dirigentes
partidos também sabem que esta faixa da população está entre os mais
abstencionistas e por isso vai-lhes dando apenas discursos cheios de promessas,
mas sem ter a mínima intenção de as cumprir.
É, portanto um
alvo fácil de “esbulho” por parte do Estado, conforme as avisadas palavras
proferidas em 2012, pelo Prof. Adriano Moreira e por mim, na altura secundadas
em artigos publicados.
Parte do meu
desgosto com o anterior Governo, com o actual, e com os Comentadores do Regime,
vem abaixo explicada, nomeadamente quando insinuam, ou mesmo afirmam, que as
pensões que estes portugueses recebem são demasiado pesadas para o Estado
português.
Isto serviu de
desculpa para os penalizar, pelo anterior Governo, e continua a ser uma
desculpa para não lhes actualizar as pensões de reforma e assim continuar a
penalizá-los pois a inflação, embora baixa, tem feito que o seu poder de compra
diminua todos os anos.
Estes cidadãos
viram descontados dos seus salários, durante uma vida inteira de trabalho
activo, verbas que não foram eles que decidiram, mas sim o Estado.
Este, o
Estado, fez um contrato com estes cidadãos em que a troco da arrecadação desses
dinheiros que eles viram retirados aos seus salários, lhes prometeram atribuir
uma verba (pensão) que lhes permitisse viver, em consonância com as verbas que
descontaram. A acrescer a este facto, o Estado ainda exige às empresas, e no
mesmo propósito de contribuir para as futuras reformas, uma taxa, que
actualmente se cifra em 23,75%.
Agora, desde
2010, o Estado incumpre esse contrato, de forma unilateral, e tem vindo a
penalizá-los com cortes, taxas e sobretaxas, o anterior Governo, e com a não
actualização dos valores a receber, o actual Governo.
Quebrou assim
o Estado, ou mais precisamente os dirigentes políticos eleitos, um contrato
feito com os cidadãos. Numa palavra, ao fazê-lo o Estado passou para o lado dos
incumpridores de contratos, para o lado dos desrespeitadores de promessas
contratuais. E continua a fazê-lo. Deixou, portanto, de ser uma Pessoa
Colectiva de Bem.
Já em 2014
denunciei esta situação, pois um dia também serei idoso. Pois cumpre-me, como
cidadão, reconhecer que se Portugal existe, o devo às gerações mais velhas e às
que os antecederam. Foram eles que fizeram Portugal manter-se livre e autónomo
no concerto das Nações Independentes. Foram eles, os agora idosos e seus
antepassados, que construíram escolas, colégios, universidades, estradas,
hospitais, pontes, empresas, televisão, rádio, foguetões, e demais bens que
todos hoje utilizamos sem nos darmos conta do esforço e dedicação que isso
implicou.
Com erros, com
certeza, mas também com obras positivas que todos, os menos idosos, lhes
devemos. Sem eles, e por questões de mera natureza, não existiríamos, pois
foram eles que nos geraram e nos deram a vida.
Finda esta
introdução apetece perguntar, antes de destapar e denunciar as mentiras
propaladas, com números concretos:
- Será lícito,
legítimo, que dirigentes políticos que deviam representar todos os cidadãos e
desenvolver, em seu nome, acções conducentes à sua melhoria de vida, coloquem
uma parte da sua população em condições de perda de qualidade de vida, depois
de se terem apropriado das verbas que estes forma transferindo durante a sua
vida de trabalho para o Estado governado por eles?
Agora não
atualizando as pensões dos que mais descontaram, (com o populismo e a demagogia
que os tem caracterizado) e dando apenas umas migalhas aos que menos
descontaram.
A minha
resposta é clara: Não, não é lícito nem legítimo, pois representa uma grave
violação de contrato, por parte do mesmo Estado que instituiu esse contrato e
que devia defender o seu cumprimento.
Ao contrário,
sendo o Estado que estabelece as Leis, de cumprimento obrigatório para todos os
cidadãos, é esta entidade, desde 2010, ou melhor os dirigentes políticos que o
têm ocupado, o primeiro incumpridor e violador das Leis e Contratos que criou.
A desculpa da
Europa é conveniente. A desculpa da dívida pública, também.
Mas não tenho
visto essas mesmas desculpas serem utilizadas para suspender ou eliminar as
PPP’s, invocando se necessário o Estado de Excepção;
Mas não tenho
visto darem essas mesmas desculpas para suspender ou eliminar as rendas excessivas
nos casos da EDP e outras, como foi feito por exemplo em Espanha;
Mas não vi nem
ouvi essas desculpas para suspender ou eliminar as isenções ficais atribuídas a
Fundações, Empresas Financeiras, Fundos Investimento, e outra entidades, que juntas
significam que o Estado deixa de receber muitos milhares de milhões de euros
que, a serem cobrados, poderiam servir para cumprir os contratos feitos com os
reformados e ajudar outras faixas da população.
É curioso que
os sucessivos ocupantes dos cargos governativos do Estado, quando lá se
encontram, esquecem as suas promessas eleitorais (PSD e PS) e vão pelo caminho
mais fácil:
-
Sobrecarregam de impostos, taxas e outra formas encapotadas de “esbulho” os
cidadãos a quem prometeram não o fazer, se estes neles votassem.
Mas voltemos
ao tema principal deste artigo: destapar as mentiras sobre o peso das despesas
com as reformas:
1º) - REFORMAS e PENSÕES líquidas
Se analisarmos as verbas atribuídas a quem
descontou durante uma vida inteira, para ter direito a uma Reforma e se as
expurgarmos dos Impostos e Taxas pagas pelos Reformados ao Estado, pois estas
verbas recolhidas são receitas e não despesas, chegamos aos seguintes valores,
nos piores anos da crise, isto é com o PIB mais baixo:
Peso percentual das reformas sobre o Total de
Receitas do Estado:
-
2011-17,13%
- 2012-20,13%
- 2013-19,89%
Isto é, as
Reformas e as Pensões, mesmo numa Economia em Recessão, significaram entre os
20,13% e os 19,89%, sobre as receitas totais do Estado, durante os piores anos de 2011 a 2013.
Muito longe,
portanto, dos anunciados e publicitados 30% a 35%, que em programas televisivos
e em discursos de alguns dirigentes partidários, têm sido ventilados.
Percebo a
superficialidade de alguns comentadores, e mesmo de alguns dirigentes
políticos, quando referiram essas percentagens dos 30 a 35%, pois esqueceram-se
que aos valores publicados haveria que subtrair as taxas e impostos cobrados
aos pensionistas e reformados, em sede de IRS e outros descontos, pois esses
são receitas do Estado, e não despesas.
Temos assim o seguinte quadro:
Quadro
1. Receitas do Estado e Pensões Líquidas
(Unidade
Monetária: Mil milhões de euros)
Receitas e PENSÕES
|
2011
|
2012
|
2013
|
Total de Receitas do Estado
|
77,04 €
|
67,57 €
|
72,41 €
|
Peso % da Reformas -
sobre o Total das Receitas
|
17,13%
|
20,13%
|
19,89%
|
Vejamos agora
qual o peso real das reformas sobre o PIB, para verificarmos da sua importância
sobre a riqueza produzida no país:
Quadro 2. - Significado das Pensões Líquidas sobre
o PIB
(Unidade Monetária: Mil milhões de euros)
PENSÕES
|
2011
|
2012
|
2013
|
P.I.B.
|
176,17
|
169,07
|
167,02
|
PENSÕES
|
13,20
|
13,60
|
14,40
|
Peso % - s/ PIB
|
7,49%
|
8,04%
|
8,62%
|
Ou seja as
pensões sobre o PIB significaram, nos anos piores da crise, entre 7,49% e os
8,62%.
Vejamos agora
uma outra mentira propalada no espaço público. Que os salários da função
pública significariam 30% a 40%. Vejamos a realidade:
2º) Quadro 3. - As Remunerações Líquidas
do Sector Público
(expurgadas dos Impostos e Taxas pagas pelos
funcionários ao Estado)
(Unidade Monetária: Mil milhões de euros)
Receitas do Estado e Despesas com o PESSOAL
|
2011
|
2012
|
2013
|
Total de Receitas do Estado
|
77,04 €
|
67,57 €
|
72,41 €
|
Peso % - salários / Total de Receitas
|
14,67%
|
14,80%
|
14,78%
|
Gostariam muitas empresas de ter este rácio,
de despesas de pessoal sobre as receitas geradas pelas mesmas. Nalguns sectores
de actividade é possível, no sector industrial é muito difícil que aconteçam.
Este rácio variou então entre os 14,67% e os 14,80%. O normal em empresas bem
geridas, do sector industrial anda à roda dos 25% a 30%.
Mas que fique claro: não defendo um Estado Gordo.
Defendo um Estado Forte, o que é bastante
diferente.
É possível melhorar este rácio, dado o Estado
proporcionar sobretudo serviços, claramente que sim. Mas não se atribua a mais esta
rubrica a desgraça do país.
Atribua-se sim a desgraça às más práticas de
governação, das últimas décadas, com a construção de rotundas, fontanários,
pavilhões gimnodesportivos em aldeias, piscinas aquecidas, auto-estradas onde
depois cobram tanto que ninguém lá passa, avenças a escritórios de advogados e
economistas, quando o Estado tem advogados e economistas nos seus quadros, etc.
3º) A SOMA das duas RUBRICAS (Pensões e Reformas + Salários)
Para analisar o
fulcro da questão que levantei, sobre as mentiras em vigor, vejamos agora que a
SOMA das Pensões e Reformas, com as dos Custos de Pessoal do Estado, somaram
(numa Economia em grave Recessão) entre os 34,92% (incluindo aqui as
indemnizações de mútuo acordo das rescisões então efectuadas) e os 31,80% sobre as Receitas
Totais do Estado.
Muito longe, portanto,
dos 75% a 80% anunciados pelos famosos “comentadores do regime” e replicados,
consciente ou inconscientemente, por vários dirigentes políticos e que foram
ditas publicamente para justificar a ineficiência e a incompetência de muitos
dos dirigentes políticos e governantes.
É esta a
realidade. Os Portugueses que a julguem como quiserem.
Quadro 4. Soma das remunerações e
pensões de reforma e sua importância
(Unidade Monetária: Mil milhões de euros)
Receitas e PENSÕES + Desp. PESSOAL
|
2011
|
2012
|
2013
|
Total de Receitas do Estado
|
77,04 €
|
67,57 €
|
72,41 €
|
Peso % - s/ T. Receitas
|
31,80%
|
34,92%
|
34,66%
|
(4º) Notas finais:
As verbas das
Pensões e Reformas referem-se únicamente ao que os Pensionistas e Reformados
recebem e não comtemplam quaisquer outras verbais.
As verbas das
remunerações da Função Pública, referem-se apenas salários e subsídios pagos
nesta rubrica.
A imoralidade
de atacar uma classe desprotegida (Os Reformados) que confiou no Estado durante
toda a sua vida contributiva, é gritante;
Acresce que
uma grande maioria dos Reformados, é oriunda do sector privado e nunca teve
nada a ver com o Estado.
Este, o
Estado, pura e simplesmente nacionalizou as Caixas de Previdência Privadas em
seu proveito e agora não quer responder pelas suas responsabilidades. Recolhei
e ficou com o dinheiro das mesmas e agora não quer prestar as contrapartidas.
Não resisto a
produzir uma última nota, para relembrar os menos informados ou os mais
distraídos, sobre alguns factos:
O regime de previdência,
com a criação de Caixas de Previdência para o sector privado, e a criação da
Previdência Pública, para os funcionários do Estado, foram criadas em
Inglaterra no pós-2ª guerra mundial, pelo Governo Conservador, e foram criadas
durante a década de 1960, em Portugal, pelo Governo de então.
As Caixas de
Previdência do Comércio, da Indústria, dos Bancários, etc, eram privadas.
Na década de
1980 foram sendo nacionalizadas pelo Estado que, em troca, se comprometia a
cumprir os respectivos contratos, a suceder nos mesmos em termos de
responsabilidades, e que agora desde 2010, o Estado, os dirigentes políticos, violaram.
O Estado
durante décadas cobrou 11% às pessoas, mais 23,75% às empresas, declarando que
essas verbas se destinavam a prover as futuras pensões de reforma das pessoas e
a assegurar o cumprimento do seu (Estado) contrato com os cidadãos. Ou seja
34,75% por mês, vezes 14 meses, vezes 30 ou 40 anos.
Percebe-se que
o sector financeiro queira ficar com essas verbas e tente que a, agora,
Segurança Social seja privatizada. Nem vou comentar este facto que só os
distraídos não quiseram perceber e continuam a fingir que não percebem. Nem
quero falar das consequências, ainda mais graves, de possível incumprimento dos
contratos que isso acarretaria.
Termino lembrando alguns factos:
- Quero
relembrar, em primeiro lugar, a declaração de um dos fundadores do PPD/PSD, o
Dr. Francisco Sá Carneiro, que afirmou em 1980, de forma taxativa, o seguinte,
e cito:
“As Reformas
são intocáveis e impenhoráveis, pois são de quem descontou uma vida inteira
para as receber”!
- Recordo também
a decisão do Tribunal Constitucional da Alemanha, que num Acórdão proferido em
2011, refere que: “As Reformas são intocáveis e são Propriedade dos
Reformados”!
- Por fim,
recordo que o Presidente do Governo Espanhol, Mariano Rajoy, do PP espanhol, em
2011, em declarações públicas, pediu desculpa aos reformados espanhóis por “só
poder aumentá-los em 1%, e não em consonância com a inflação, como era devido,
dada a crise financeira”. Não só nada lhes tirou como os aumentou, embora
pouco.
Talvez por
estas e por outras a Espanha cresça a 3%.
Elucidativas
estas atitudes.
Miguel Mattos Chaves
Doutor em Estudos Europeus (dominante
Economia)